terça-feira, 31 de agosto de 2010

A miscelânea deste novo (nosso) mundo

David Weinberger doutor em filosofia e autor do livro “A nova desordem digital”, que não ficará esquecido na estante, mas que provavelmente irá me acompanhar como um guia formidável para retornar a folhear esse amontoado de átomos de segunda ordem. Chris Anderson dá a “dica” logo na capa: “Leia este livro e entenda por que a delirante desordem em breve nos tornará mais inteligentes”.

O mundo digital, afirma Weinberger (2007) nos permite “transcender a regra mais fundamental de arrumação do mundo real: em vez de tudo ter o seu lugar, é melhor que as coisas sejam designadas a vários lugares ao mesmo tempo”. Portanto, a forma como recebemos, compartilhamos e trocamos os nossos conhecimentos e informações mudaram, já não fazemos parte de uma construção de idéias lineares. Vivenciamos isso. Na “terceira ordem da ordem” podemos trilhar nossos caminhos. Buscar, trocar, compartilhar, enfim, podemos exercer a liberdade da troca de conhecimento e informações. Temos o livre-arbítrio de deixar implícito – mesmo sabendo que desta forma estamos deixando explícitas muitas coisas que não podemos ou, não queremos falar. Na “ordem da miscelânea” o papel já não é a única fonte, colocamos em prática a seleção e o descarte em apenas um clique. Segundo Weinberger (2007, p.20) “a terceira ordem remove as limitações presumidas como inevitáveis no modo como organizamos as informações”. O mundo digital é diversificado, a realidade tem múltiplas faces, não recebemos apenas dois ou três tipos de informações, recebemos um “aninhamento”. Temos a liberdade de fazer as nossas próprias escolhas, de determinar o nosso caminho do conhecimento.

A internet ajudou a democratizar o acesso a informação, está modificando e alterando as formas de sociabilidade e de economia das sociedades tradicionais. A internet é livre, para pesquisa, pesquisadores, construção do conhecimento, de informações... Mas não está livre da censura. Acontece hoje a
blogagem coletiva de repúdio ao AI5 digital. O governo ainda não tem o controle, mas eles querem. Por isso, hoje é dia de dizer um MEGA NÃO ao PL84/09, que pretende retirar a liberdade da internet, através da censura. Participe, Leia , informe-se , divulgue. Mais de 155 mil pessoas assinaram o Manifesto em defesa da liberdade e do progresso do conhecimento na Internet .

Veja o que os Artigos colocam em risco:

OS ARTIGOS 285-A, 285-B, 163-A, 171 e 22 DO SUBSTITUTIVO DO SENADOR AZEREDO COLOCAM EM RISCO:
• a política de ampliação das redes abertas de banda larga;
• a liberdade de compartilhamento;
• a liberdade de expressão;
• a liberdade de criação;
• a liberdade de acesso;
• a privacidade;
• o anonimato.


OS ARTIGOS 285-A, 285-B, 163-A, 171 e 22 DO SUBSTITUTIVO DO SENADOR AZEREDO PODEM CRIMINALIZAR:
milhares de jovens e adultos que compartilham MP3, imagens, fotos, bits;
• centenas de ativistas e pesquisadores da cibercultura;

• qualquer pessoa que queira abrir o sinal wireless em seu condomínio;
• fanfics, fansubbers, gamers que jogam em rede;
• pessoas comuns que tiveram suas máquinas ‘escravizadas’ por crackers e não possuem conhecimento técnico para se defender;
meras condutas comuns, de interpretação subjetiva quanto a possíveis intenções ou risco de danos, desviando parcos recursos policiais do combate ao crime organizado com alta tecnologia, a verdadeira grande ameaça do cibercrime, blindando-o contra as leis já vigentes ao inviabilizar a investigação eficaz (inciso II do art. 22).


OS ARTIGOS 285-A, 285-B, 163-A, 171 e 22 DO SUBSTITUTIVO DO SENADOR AZEREDO NÃO SÃO ESSENCIAIS PARA
combater a pedofilia, que já foi tratada no projeto de lei 250/08, aprovado pelo Senado em julho deste ano, e que preenche as lacunas do Estatuto da Criança e do Adolescente. Note-se que a SaferNet, principal organização de combate à pedofilia na internet, é contra este projeto de lei 84/99 (ex-PLS 89/03).

Assine a petição e diga um MEGA NÃO para o projeto do Senador Azeredo.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Tá liberado!

Sexta-feira. Cheia. Cinza. Sem final de semana. E os gatos despertaram loucos. Resmunguentos. Soltam um miado estridente. Um ronrona deitado, balançando o rabo, enquanto outro o chama para dar continuidade. A Loretta, como sempre, apenas observa o melhor momento para intervir. Descontrolados os dois correm pela casa como num ritual de comemoração. Pelo ar puro, pela sexta-feira livre, pela comida fresquinha, pelo final de semana.

A manhã dessa sexta-feira anunciou uma boa notícia. Depois da ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV), na última terça-feira (24), ter ingressado com ação no STF (Superior Tribunal Federal) contra restrições de Lei Eleitoral, sustentando que “as normas violam a livre manifestação de pensamento, da atividade intelectual, artística, de comunicação e de informação, garantidas no artigo 5º da Constituição Federal”. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), surtiu efeito.

O ministro Ayres Britto, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu parte da lei eleitoral, liberando a sátira política na propaganda eleitoral de rádio e televisão. Para o ministro “não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, pouco importando o Poder estatal de que ela provenha”. No despacho, ele cita algumas vertentes do humor nas mídias e salienta que estas “compõem as atividades de imprensa, sinônimo perfeito de informação jornalística”.

O humor vai voltando aos poucos, com muito cuidado para não despertar o sorriso amarelo de qualquer um por aí. E eu volto. Ela é sexta-feira, cheia e cinza.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Deixa rir

Nasci em um país democrático. Vivemos em uma democracia. Ao menos, é isso que eles nos dizem. Ao menos é isso que sei. Aqui, no país do futebol, onde as grandes corporações midiáticas estão nas mãos de poucos, onde a arte é feita em todos os cantos, onde muitos artistas sobrevivem dessa arte, onde o ensino engatinha no bê-á-bá tentando tomar forma, sem forças para se unir a universidade. Aqui, no país do carnaval, nos fazem rir de tantas formas. Aqui, nesse país das paisagens belas, nos tiram os últimos trocados; levam a nossa dignidade na primeira esquina que cruzamos. Aqui, no país democrático, situado na América Latina, somos movidos a Leis, não que isso nos torne um país onde a justiça é levada a sério. Não. Aqui, adoramos as Leis. Isso, não quer dizer que as Leis de trânsito, por exemplo, sejam respeitadas. Aqui, nesse país democrático, onde a censura é coisa do passado não aceitam jornalistas diplomados. Não querem cidadãos bem informados, não aceitam crianças bem nutridas crescendo em convergência com o mundo.

Aqui, somos um povo sorridente. Afinal, temos motivos para tanta felicidade. Nossas crianças estão na escola (não importa o descaso com os professores), somos um país em pleno desenvolvimento, somos o país da Copa de 2014, das olimpíadas em 2016 (não importa a nossa infra-estrutura, para isso, temos dinheiro). Somos o país das grandes indústrias. Somos o país das fontes naturais (não importa se tratamos o lixo com descaso). Somos o país dos grandes: poetas e escritores e atores; somos o país da literatura (mesmo que nossas crianças cresçam longe dos livros, e cada vez mais íntimas das conversas virtuais). Somos o país onde o nosso sistema de saúde funciona perfeitamente bem. Enfim, somos um povo feliz! Mesmo que ao chegar na “terceira idade” tenhamos que nos submeter à aposentadoria. Somos brasileiros!

Não desistimos nunca. No Brasil, desde 1997 a Lei eleitoral, proíbe que “emissoras de rádio e TV usem trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem o candidato, partido ou coligação”. Enquanto isso, eles nos fazem rir nos programas eleitorais veiculados na televisão. Enquanto isso, humoristas, dançarinas, sorrisos soltos e tantos outros nos mostram que o melhor caminho ainda é se enveredar para política (caso a fama não seja um estrondoso barraco). Enquanto isso, eles nos fazem rir de todas as formas nos empulhando em horário nobre, um humor de primeira. Sem ridicularizar ou degradar.

Eles estão tirando sarro da nossa cara! Não temos mais humor levado a sério. Não podemos mais rir da desgraça, digo da nossa desgraça política. Os humoristas do nosso país democrático não podem mais satirizar os candidatos. É lei. Vamos obedecer! Tem muita e tanta coisa na televisão brasileira, nas rádios das nossas cidades e na internet que nos agridem tanto ou mais, do que era feito. Há tantos outros programas que ridicularizam os cidadãos, que vendem o ilusório (...). Mas eles não se importam com os nossos anseios, com o que almejamos, com o que nos aflige.

Fato é que os mesmos que defendem a desregulamentação da profissão do jornalista, que censuram o humor nas mídias, que querem nos calar de qualquer forma, não têm interesse que este nosso espaço público seja mediado por profissionais. Tanto faz se for de uma forma coerente, bem humorada, satírica. Fato é que, eles não querem cidadãos com conhecimento, eles não aceitam esse tipo de confronto. Eles podem. Nós devemos nos calar. Neste período, o sorriso vai ser largo, vai soar falso, assim como as palavras; as promessas vão ser cômicas, vão invocar a Deus, vão difamar companheiros; que depois vão se unir para ocupar os cargos que restaram. Neste e em tantos outros períodos, vão nos fazer rir de tanta canalhice, eles só querem o nosso povo feliz, é de coração. Nada particular. Eles querem o poder. Seja no humor, na comunicação, na educação, seja o poder do livre-arbítrio. Eles não querem doutores em ciências humanas. Enquanto isso, me seguro pelas bordas.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Metade e meia

Outro ponto de partida. Outra vista. Uma bela. Uma sonora. Numa dela. Uma imagem.
Numa dessas. Uma sequencia paralela. Encontro. Outra imagem naquela janela. DesEncontro. Fecho o ponto. Aberta. Porta. O sol. As fugas. Dela. Os mesmos rumos. Meses. Mesmos. Mês. Teus braços. Contínua resistência. Embaraço. Foco. Continua no mesmo rumo. DesFoco. DesEmbaço os olhos. Lentes. DesEmbaraço os nós. Lentamente. Nós. Tela. Desatino. Nela. Agora. Desafino. Ano. Metade. Meia.
- Que queres com a leveza dos meus passos se meus sapatos não se encantam pelos seus?

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Tempo e espaço

Cinquenta e oito horas desconectada, sem celular, sem internet, sem computador, sem rádio, sem música. Apenas os livros e um par de família e cinco horas de viagem e aquele destino. Uma partida para o lugar simples. Que parece mais longe deste mundo quando a estrada de terra aparece. As lembranças se achegam devagar. A noite gelada e o vento nos abraçam. A senhora que nos recebe na casa de madeira, tem o rosto triste, mas a alma bela e um coração gigantesco. Abraça com os braços de quem acolhe, protege e não quer deixar partir. É feita de fibra e raça e sensibilidade. É mulher admirável, não somente por ser mãe da minha mãe, mas por ser sensível, simples, ter uma história linda e por manter o amor há mais de cinquenta anos. Na casa da Vovó a cama prontinha nos espera, o aconchego é simples, mas ali temos a certeza de que temos o essencial para vivermos em paz, sossegados do mundo, como ela vive. Ela ainda quer ser independente, apesar das poucas limitações e os cuidados essenciais que a sua idade nos exige. Resmunga sozinha por causa da tramela da porta, admira-se frente às novas tecnologias trazidas pelo meu irmão no computador, controla a sua dieta, organiza sua casa, é zelosa com os netos, e também não sabe onde essa juventude vai parar. Mas, não sorri mais na hora do retrato. Seus oitenta e três anos são sentidos pela ausência do seu par. Falta. Quanta falta ele faz. Mas ela não deixa cair.


Para aqueles campos abertos onde a vista perde o sentido, procura o infinito, encontra luzes e estrelas sem fim. Retrato da família na mesa da saleta, aconchego de Vovó, comida de tia, receptividade encantadora. As tantas horas até lá, recompensam o caminhar sem pressa, sem hora para voltar. Sem compromisso. Sem espaço, no ciberespaço. Se há mais de dez anos atrás quando todo mundo nas grandes cidades, que podiam pagar por uma internet discada, começavam a se conectar em rede, em São Pedro do Butiá - RS, na região das Missões, a luz era artigo de luxo para quem morava na cidade. “Butiá”, ainda tem a maioria da sua população de 2.744 habitantes vivendo na zona rural, é uma cidadezinha bonita, mas simples. Uma cidade que desde 2008 ostenta a estátua de São Pedro, circundada pelo Centro Germânico Missioneiro, seus trinta metros de altura despontam mesmo sem a sua iluminação característica. A cidade ganhou um local onde a história da imigração alemã é recontada, e a estátua ganhou destaque no jornal Zero Hora, pelos tantos zeros que foram investidos.


A comunidade de Santa Terezinha, onde está à casa da vovó, é distante cerca de 8km da cidade. No final dos anos 90, o asfalto nem cruzava as cidades, apenas um telefone para toda uma comunidade ligava-os com o mundo. A comunicação era quase restrita. Os correios até lá não chegavam (e ainda não chegam). Algum político olhou para aqueles cidadãos. Meu avô Arthur, então comprou uma geladeira, um freezer para o leite e as carnes não estragarem, teve enfim, direito a banho quente (um chuveiro que não era feito de lata) e um banheiro de verdade. Comprou uma televisão a cores, antena parabólica, mas o radinho a pilhas não foi deixado de lado, ainda está lá. Na casa ao lado, a casa da Tia Rosa e do Tio Dionísio, a mesma cronologia, com a adesão do celular e mais recentemente, a máquina digital. Em breve, a internet também vai chegar e irá fazer parte das suas vidas, não apenas o
Orkut, e as outras ferramentas de conversação. Mas toda a sua gama de oportunidades e possibilidades que ela traz. Ela chega até a igreja da comunidade, e dali não passa, mas ali, há muita empolgação com estas novas tecnologias.

“Butiá”
não está mais “isolada” do mundo, mas mesmo assim, lá na casa da Vovó é possível sentir um isolamento, é sem fim. É ar aberto e puro e belo e simples e acolhedor. Viajo mais algumas horas e perco o jogo do meu time, por não ter um rádio digital ou a pilhas, mas meu corpo está descansado, a mente tranquila, tudo certo para recomeçar a rotina. Com a certeza de que não fico desconectada do mundo virtual por mais de três dias. Nas últimas férias, corri para a única Lan House em São Pedro do Butiá, precisava ao menos ver a minha caixa de e-mails. Mas ali, caminho de olhos bem abertos. Onde a noção de tempo e espaço diferem-se dessa em que vivo normalmente. Neste ciberespaço, retorno outra vez aos estudos. Para tentar compreender. Para desorbitar. Para viajar.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Setenta e seis

Uma cidade que se encontra quase escondida, não há praia por perto, nem campos se perdendo no horizonte. Para chegar, seja qual for a rota, você vai passar por lindas sinuosidades, paisagens que confundem o olhar e te fazem girar. Ao descer para o centro, bairros, ruas limpas, sinalizações, não há como se perder. É só seguir reto, seguir o fluxo, a movimentação. Caso, queira pedir informação, com certeza encontrará uma pessoa muito educada com um sotaque forte, e de vez em quando esquecendo os erres. A praça da cidade é logo ali. Chegou ao centro. Uma vista linda. Onde as faixas de segurança são incrivelmente respeitadas. As sinaleiras para pedestres respeitam um ritmo próprio, como num compasso todos pacientemente aguardam sua vez. Educação e informação no trânsito mudam uma cidade. Embelezam. Não é saudosismo. Ou, talvez seja. Mas aquela cidade traz realmente uma simbologia da paz para cá. Uma simbologia de que uma pequena cidade, com algumas pessoas, um moinho por perto, um armazém e um boteco, atingem a terceira idade com vivacidade.

Não há como não rememorar os bons momentos que por lá passei na infância e adolescência. Acho que nasci em Concórdia, SC. Acredito que a gente é natural de onde vem. De onde parte para a vida. Aonde aprendemos a compor as primeiras frases. A suportar a saudade. A descobrir para o que viemos. Distante mais de 350 km, ficaram todos os familiares há vinte e cinco anos atrás. Nasci no Rio Grande do Sul, numa cidade antiga, com belas construções, histórias e com as minhas raízes. Mas totalmente diferente do que vivi nos anos em que passei em Concórdia. Uma cidade acolhedora, com um povo que vive para o trabalho. Uma cidade que cresceu junto e em torno da Sadia, mas nem por isso deixou de ter personalidade, criar a sua própria história, desenvolver seu potencial. Uma cidade não é feita apenas pelas pessoas que habitam as casas, consomem os produtos, geram receita. É constituída pelo resto quase imperceptível. É constituída pela sua beleza, políticas sociais e cidadãs. Concórdia é isso. A sensação é de acolhimento. Em dia de festa tem bolo, música e até mortadela para o povo. Ou, para quem conseguir um pedaço.
Setenta e seis anos. O bolo? Setenta e seis metros de comprimento, com mil e setecentos quilos. A mortadela? Mil e oitocentos quilos. Isso mesmo. Bolo e mortadela para o povo no dia do aniversário da cidade, e pãozinho para acompanhar o salgado. O bolo foi cedido pela Prefeitura e a mortadela é Sadia, claro. Montado na hora, o bolo leva uma camada de glacê. Portanto, é impossível você não levar essa camadinha nos cabelos, nas mãos, na roupa, porque DEZ mil pessoas (público estimado deste tarde) tentando tirar uma lasquinha é inevitável que você experimente ao menos a cobertura. É feriado em Concórdia, sol, clima agradável (bem melhor que o friozinho do Sul), reunião de gente e música. E eu aqui, sem nenhum doce para beliscar. Minha esperança é comer uma comida boa no domingo. A 25ª Festa Nacional do Leitão Assado (FENAL) acontece no dia primeiro, no Parque de Exposições da Cidade. Então, como não sou vegetariana, não estou de dieta, cuido da minha alimentação, vou aproveitar (mesmo porque acho todas as alternativas anteriores uma besteira). Carne suína para quem quiser comprar, eles esperam que DEZ toneladas de carne sejam consumidas por mais de DEZ mil pessoas. É mole? Eu vou! Os pratos são deliciosos. Tem porco no rolete, porco não sei aonde, porco com maçã na boca, porco a pururuca. Hum... Domingo eu abraço Concórdia. À bientôt, Concórdia!

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Perigo

Como dois e dois são cinco. Passeia por entre narrativas. Desmistifica a vida e os sabores e os aromas e aqueles desamores e isso e aquilo que incomoda e que abarrota suas ideias. Ah, esse perigo. Bom senti-lo. Bom adorá-lo. Falta alguma coisa? São pequeninas delas que se unem e se encaixam e se embaraçam por entre as veias. É quatro. Ô, perigo de me jogar pela janela. Sair correndo pelo quarto. Dança e deixa as palavras saírem pela boca. Num só. Multiplica. Solitária. Num. Quarto. Esquece. Espairece. Endoidece. O perigo. Relaxa. Suspira. A vida.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Uma dessa, Maria

Foi ao ar. Foi voar. Aprontar a mala. Lá estava o céu. Tão distante, é tão rápido chegar até ele. Lá em cima é outro mundo e se tivesse todo ar suficiente, por ali viveria. Como aquele anjo que viu passar e dizem que é uma grande asneira acreditar neles. Acreditem no que quiserem. Aqui não dá mais. Por aqui nada protege as flores. Apenas aqueles cactos verdes dependurados na janela. Apenas eles sobrevivem ao vento gélido do extremo. Plantas fortes e valentes. Ela encontra-se num imenso espaço resguardando o sol. Fora desse mundo. Por fora da esfera, da busca por um planeta sustentável. Fora do mundinho daqueles que se escondem atrás da mentira. Dos que ganham dinheiro às ganhas, daqueles que fervilham a mesmice, a arrogância, a empáfia. A eles falta um bocado de humildade. Daqueles que se dizem poetas, profetas, daqueles que odeiam tudo o que é popular. Maria não sai só para sambar.

A revolta toma-lhe o corpo inteiro. Nada a transgride desse estado favorável a sua destreza. Não viola as leis. Não desdobra as cobertas em cima do banco. As sacolas a esperam. A sopa, as colheres e o cobertor irão finalmente aquecer quem bebe para esquecer o frio. Morde os lábios, destrói os últimos pedaços de unha, coloca seu casaco, uma meia, mais uma meia de lã, mais um cachecol, um chapéu para cobrir as orelhas, as luvas vermelhas. Vai. Distribuir a sopa quente para que enfim possam aproveitar. Sopa das melhores. Feita com frango, salsinha, batata, cenoura, massa fresquinha e aquele caldo de legumes. Maria tem fibra e também chora pelas coisas da vida.

Para depois da primeira esquina em frente às lojas de gente bacana. Com copos e colheres de plásticos, saboreia junto com aquelas pessoas desconhecidas a sopa feita com os últimos centavos do seu bolso. Um aperto no peito, a voz começa embargar e aqueles sorrisos de satisfação lhe contentam a alma, abrandam o coração. Ah, numas dessas Maria, eu te encontro e a caridade se faz. Sai a voar pelos ares longínquos da sua imaginação. Se ela não tivesse abandonado o seu dever. Bem assim, como deve ser, bem assim, do seu jeitinho. A serenar corações, transformar o dia de alguém, compartilhar um mundo, fazer sorrir, aquecer, abraçar. Tudo pelo simples fato de ajudar e mesmo assim, faltam-lhe os trocados. Numa dessas, Maria alimenta sua vida.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

*Papapa* Super heróis

Indicado a clipe do ano de 2010 no VMB da MTV, pra votar: clica aqui.

Mombojó - Papapa. Direção de Fernando Sanches.


***
Se o inverno não tem
Então espere o sol vir iluminar o seu lar

Papapa...

Por mais que eu pense e desista
Por mais que ele venha e queime a vista
Calando a sombra e os sapos
Com seu abraço de sol

Não desisto em conter um terral
Que precede o chover
Mas não vem, mas não vem

E não há, não aqui, em conter um terral
Que precede o chover
Mas não vem, mas não vem
Que não há, que não há, não aqui

Papapa...

No ar condicionado do shopping
A dez graus a menos
O suor que escorre da sua pele tende a secar

Você diz gostar do carnaval
Sem separatismo
E sonha em dormir na geladeira

Se o inverno não tem
Então espere o sol vir iluminar o seu lar

Papapa...

Você diz gostar do carnaval
Sem separatismo
E sonha em dormir na geladeira

***


quarta-feira, 21 de julho de 2010

cinza

É na solidão que o homem se encontra, no seu belo isolamento. Na sala o frio se espalha, as imagens refletem sua vida. A porta aberta não dá conta de esquentar seu corpo. Lá fora ultrapassa os vinte graus. A tempestade vem aí, no noticiário não se fala em outra coisa. Tão completamente calado e seu corpo remexe impaciente. Trança suas pernas num passo falso. Barganha os sons. Vende sorrisos. Observa as suas mãos. Enche seu coração e lava a alma num gesto ritmado, eterno e novamente perde-se na beleza. Cantarola alto Eu te amo “Como, se na desordem do armário embutido/Meu paletó enlaça o teu vestido/E o meu sapato inda pisa no teu” numa esperança de que os vizinhos ouçam. Para que a moça do andar de cima com seu salto alto possa entender, ou, tome consciência. Não sabe. Não está na hora. São as pessoas que andam, ele continua ali, só. Reconhecendo seu espaço. Nada além. Seu olhar atravessa a sala. O que pode levar em baixo dos braços são seus livros e aquele gato aninhado na coberta em cima da caixa. Nada a mais. Seu olhar atravessa à estante. Palavras. Nomes. Fotografias. Recordações. Florbela sempre foi sua melhor companheira. Hoje a mulher é outra. Mas os versos endoidecem seu coração, “... são como sedas pálidas a arder...” é Florbela Espanca que faz seu corpo estremecer.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Carrego comigo

Sinto que se pudesse quantificar esse sentimento, me perderia novamente diante dos números. Se pudesse unir, dividir-me ou simplesmente partir para a lógica, poderia envolver meus braços em todos os pontos. No Porto, Florianópolis, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Passo Fundo, pelo oeste de Santa Catarina. Pelas ruas de São Paulo me perderia tentando reunir todos em um único boteco de esquina. É saudade das boas. São trocas.

São poucos e dizem que assim deve ser. Os números não são altos, assim é fácil. São bons momentos impossíveis de racionar. São pessoas maravilhosas as quais podemos chamar de amigos. Escolhemos, mas não tem no mercado para comprar. Não podemos pedir na tele-entrega. Não podemos impedir os rumos. Mas temos a certeza da amizade. Nas minhas caixas, na vermelha, na remendada de figuras, na florida, na laranja, elas guardam as nossas lembranças. É meu irmão, é o outro irmão que a cidade gelada me deu. É a prima. A amiga de infância, os amigos do teatro. Aqueles meninos que juntos inventamos o mundo.

Quando o reencontro acontece à gente percebe a mudança do tempo, a maturidade evidente, mas o sorriso, o abraço forte e a envolvente amizade, serão sempre os mesmos. No sofá, sentados lado a lado, as lembranças retornam, tenho ali um amigo. Encosta a cabeça no meu ombro e juntos dividimos sonhos, lembranças. Os que nos deixaram e aqueles amigos que para longe foram, tão longe que não podemos sequer pedir um abraço. Sequer ler suas palavras, ouvir sua voz, rever seu sorriso, rir das suas piadas. Estes dois o sentimento é inexplicável. É perda. É falta. É a tal da discrepância do destino.

Amigo é isso. Amigo é feito para abraçar, amassar sem malícia, esquecer as rixas futebolísticas, fazer rir, irritar de tanta saudade, abrigar, brigar e refazer a paz. Agora, arrume as malas, compre as suas passagens, peça carona e proteja-se do frio. Vamos nos encontrar e brindar a amizade. A vida é assim. Essa é a graça da vida. A cada metro de distância a saudade aumenta, o amor aumenta e a certeza do reencontro vive. Outros elos dessa amizade serão vistos. Amigo também é feito para equacionar a saudade.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dualidades

Dias atrás me pediram para colocar na balança o jornalismo e o teatro. Escolher. Contestei: “e você palmeirense, o futebol ou a música?” “Ah...” Disse ele espantado, “eu amo igualmente os dois!” E isso é ótimo. É ótimo e belo ter o que amar. Distribuir amor, trocar conhecimento, ritmos, sons, palavras, poemas. Seja lá o que for, fazer rir, dançar, cantar alto, escrever, criar sons. É por isso que eu também amo igualmente os dois. Não é fanatismo. Nem paixão. É amor. Claro e evidente. Sem ofuscação. Por isso não escolho. Não as peso. Elas andam juntas, coladinhas em mim.

Minhas ações são desenvolvidas por pessoas e para pessoas. Pois acima de tudo faço o que amo e faço com amor, ética, respeito. Faço desta maneira outras pessoas felizes e esta é a minha arte, meu ofício, minha vocação. A arte que traz talento, dedicação, estudo e conhecimento dos fatos. Da cientificidade que envolve esta caixa preta, das palavras, da informação, da ética, da comunicação, que envolve o jornalismo. Estas dualidades envolvem a minha vida. Mas são dualidades convergentes entre si. E isso incomoda. Porque poucos sabem o que é o ator. O que faz um ator. O que o ator precisa estudar para estar em cena, seja lá onde for. Assim, como o jornalista.

Vivemos em mundo onde a prática prevalece, um mundo virtual que nos aquece no isolamento conjunto. O teatro, dizem que é feito de mentiras. Mera casualidade com as coisas da vida. As relações humanas em sua materialidade mais ínfima são encaradas. É nisso que nos inspiramos. Na vida. Na sua vida. O cotidiano maçante é posto à prova no palco, a comédia está feita. O riso rola solto. A tragédia é feita por pessoas, na sociedade, posta ao palco, faz chorar. Na televisão já não choca mais. Na visão do dramaturgo Sérgio de Carvalho, “Stanislavski queria algo mais do que recriar a verdade da vida no palco. Queria uma verdade que fosse bela, que tivesse sua plasticidade própria, seus ritmos sutis, sua vibração sensível. A visão poética brechtiana se acresce ainda de outra exigência: o teatro precisa de uma verdade que, além de bela, seja útil. E a utilidade é de ordem política”.

Clara dualidade: vida e arte. Respiro e expiro. Concentração. Os bonecos revelam o próprio olhar. Mãos. Espuma. Cores. Tinta. Tecidos. Luzes. Sorrisos. Narizes. Olhos. Movimentos. Os “narizes batatinhas” animados, olhos vidrados, compenetrados na história, nos seus enlaces de atriz. Colocar a menor máscara do mundo revela muito além do que se pode imaginar. Vai afundo no processo de construção de um clown, e para isso, percorre seu interior mais ridículo. Despe-se de toda a defesa. Foi feito para rir. Divertir. É uma pesquisa do seu eu, do seu eu Clownesco, onde reside a liberdade. A liberdade de deixar fruir a criança que habita dentro de cada adulto metido a gente grande. Ele revela o seu ridículo. Revela a sua verdade, a aceitação. Quando encontrei o meu clown ouvi dizer: “o coração do palhaço é uma flor e o palhaço nasceu para doar essa flor para o mundo”.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

silêncio

O que se pretende?
Que ser pretende um?
Ser
Inteligente
Independente
Quente
Ser
Fervente


A
Sós
Como
Nós
Em
Nós
Ambos
Emaranhados
Em nós.

domingo, 11 de julho de 2010

Alvedrio de Frederico

Moça da pele branca, sorriso curto, lábios rosados, cabelos negros, braços cheios, pernas pomposas sempre à mostra. Dedos curtos, unhas negras. Boca cantante. Nas caixas resgata fotografias, guardanapos escritos. Declarações. Cartões. Paixões. Adélia ouve todas as madrugadas a mesma sintonia. A vida dela é uma trilha sonora seguida pelos passos, compassos e ruídos daquela canção. Uma partitura simples rematada pela insônia. Dança pela casa. Braços soltos ao longo do corpo, cabelos desgrenhados, pés descalços. Dança sozinha. Com seu vestido colorido feito chita. Dança na praia, sentindo a brisa do mar gelado. Dança alçando voos com a areia em seus pés. O céu simboliza a chuva. No peito, a saudade latente de um passado que resolveu fazer-se presente.


Ele está nas páginas dos jornais. Nos livros e nas flores. Cervejas e bebidas mal cheirosas. Da janela o único mundo, inatingível. Ele dança em outro compasso de uma música esquecida. Faz e refaz, recortes de papéis, tecido e espuma, as mesmas flores. Pintura. Na parede desenhos e formas inacabadas. A sua arte. Armazena palavras para os papéis e as cartas retornadas. Frederico. Frederico não é nome de bandido. Mas deixou para trás a liberdade. A sua e de Adélia. Não fala. Não há ninguém para trocar uma palavra. A comida chega pela fresta, o brilho do sol não vê há meses, o cubículo úmido e escuro é presente dos seus atos. Come e solta fora, um ritual suntuoso. Lembranças de um carnaval desvairado. Sem mágoa a sangue-frio.


Estava no sétimo, no primeiro, no segundo andar à procura de algum novo som. Nada. O edifício estava em silêncio como em nenhum outro carnaval. Mas ela podia ver os confetes e as serpentinas. Ela podia ouvir aquelas risadas conhecida, os desconhecidos e todos os perdidos. Adélia era moça bonita, despertava algum sentimento nos homens. Mas não deixava ninguém experimentar. Perdida na liberdade, nos carnavais, no amor que prendeu. Movimentava-se em círculos atormentada. Sentia um aperto no peito. Frederico tinha saudade de gente. De agir de acordo com a sua própria vontade, de decidir sua sentença, seu caminho, de dizer a verdade. Tinha saudade da liberdade e principalmente da sua gente.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Sexto dia

Elena estava afundada. Livros. Papéis. Canetas. Folhas e mais folhas espalhadas pela mesa. O cigarro defumando o ambiente. Teorias. Entrava em consonância com vários autores. Aquelas linhas. Formidáveis linhas tênues que separavam o abismo. Sutis nós que se entrecruzavam nos seus pensamentos. Ali segurou. Num súbito olhar o calendário marcava o dia seis do mês.

- Putaquepariu! O aluguel venceu!

Arrecadou carteira, celular, óculos, caneta, agenda, pen drive, boletos bancários, a lista do super, da vendinha, da farmácia, do açougue. Enfiou tudo na primeira bolsa que encontrou. Fechou a porta de casa. Abriu. Colocou seu salto alto e partiu. Elena mal sabia o inferno que lhe esperava. O sol estava tomando conta da cidade. “Dentro do banco ameniza”.

Uma fila a impedia de entrar. Era ali que ela deveria ficar até chegar ao próximo andar. O homem de camiseta azul impaciente distribuía olhares. Nas mãos um cartão azul, um papelzinho surrado com uma sequência de números e letras. No rosto enrubescido as bolinhas de suor tomavam conta da testa. Chegou sua vez. O moço não ouviu. Entregou-lhe uma fichinha com números e letras que dava acesso ao segundo andar. Ali, iria resolver o seu problema. Ele tentou retrucar, saber o motivo de todo o seu dinheiro escafeder-se da conta. A fila anda.

Elena recebeu suas letras e números. Deixou o celular e a chave de casa. A porta emperrou. Voltou. Olhou dentro da bolsa. O guarda-chuva. Alcançou o homem no elevador. Esbaforida. Ele parecia mais nervoso, seus olhos, suas mãos e aquelas bolas de suor não paravam quietas. O cheiro era quase insuportável dentro daquele cubículo. O ar condicionado dentro do banco não dava conta. Procurou uma cadeira para sentar e organizar a bagunça da bolsa. O dinheiro não vai dar conta. Riscou a alface, a abobrinha, as cenouras. Os tomates estão muito caros. As vacas devem estar produzindo pouco leite. Menos duas caixinhas. As batatas duram um pouco mais. Ainda tem sabão em pó.

Ela ficou ali por mais de meia hora. Resolvendo contas, cortando ingredientes e pensando naquelas teorias que lhe esperavam. Desceu. Saiu. Sentiu um braço envolver a sua cintura. Era o homem de azul. Disse para lhe entregar o dinheiro, o celular. Disse que era um assalto. Gritou. As pessoas pareciam se afastar. O braço do homem apertava com força as dobras da sua barriga. Boca fechada e andando! Depositou toda a sua força para se desvencilhar. Ele não podia levar aquela bolsa, com o guarda-chuva, o dinheiro do super, das batatas, do leite. Cambaleou. Ele correu. Virou a esquina. As pessoas sumiram. Sentiu seu corpo inundado de raiva. Encharcado de suor, quente. O dinheiro da conta vai sumir. Maldito início de mês.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

gélido

Os dias andam curtos. As estrelas somem rápido no céu. Lua. Sequer teve tempo para admirá-la. Mas esse tempo corre bom. Esse vento vive. Suprime e oprime o ócio. As ideias partem em quinhentas e vinte e poucas no céu. No horizonte aquelas cores lindas. As cores parecem querer misturar-se ao branco das nuvens gordas. Ah, essas gorduchinhas. Queria todas pra mim, emoldurá-las em sonho. Descobrir a cada novo vento uma nova forma. As teorias seguem conforme as linhas transacionais. Um beijo no gelo.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Piripaque

Sexta-feira. Dois de julho de 2010. Oito horas da manhã. Um risco de sol entrava pela sacada. Vestiu sua camiseta azul com o número quatro estampado nas costas e saiu. O barulho dos carros frenéticos embrulhava seu estômago. Embaralhavam seus olhos ainda adormecidos. O sol não parecia querer esquentar. O céu completamente azul parecia solitário. As crianças serelepes a passos largos deixavam a escola. As horas passaram rápido. Os carros tentavam se esconder. As lojas fechadas. O verde e amarelo até nos cães. A cidade parou? Quase o silêncio. Aquelas máquinas jamais param. As mulheres não apareceram no salão de beleza para vibrar. O telefone não tocou na pastelaria. Sentou-se confortavelmente. Sentiu seus pés gelados. As mãos ansiosas.

Seus olhos nervosos percorriam o ambiente. As toalhas no varal, os quadros, a roupa da mulher que passava solitária pela rua, os lençóis no varal da vizinha, o suco no copo, tudo igualzinho a cor da camiseta daquele time. Jogo de futebol outra vez. Os gritos da vizinhança anunciavam o primeiro gol. Bolas na trave, expulsão, gol e mais gol. Não é comentarista de futebol, não pintou a cara, não saiu à janela para comemorar, não entende “patavinas” desta maravilha. Mas inflama o peito, arrepia-se, segue a mesma causa daqueles. E também fica perplexa frente à televisão. Pode ter sido a mulherada do salão que se ausentou na reta final. Mas será que foi o “pé frio”? Será que Jorge Cajurú, está certo? “A copa do mundo está vendida e o Brasil não vai ganhar”. Mas é qualé quié desse sentimento?

Para alguns é uma “mistureba” gostosa. Para ela, a vontade de acariciar. Acalmar o choro. Abraçar forte as tristonhas crianças que sonharam em ver pela primeira vez a seleção brasileira ganhar a Copa do Mundo. Mas eles entendem muito mais do que ela. É sensação momentânea. Na sacada a aflição. A cada lance perdido gritos, palavrões, vozes estranhas. Mas o que ecoava mais saliente era a narração de Galvão Bueno rouco, quase sem voz. Se Juan, o número quatro, não tivesse perdido aquele gol Galvão teria ficado sem voz. Felicidade geral na sacada. “Mas vem cá, tu sabe sambar?” Porque eles sambaram em um tempo só. A revanche das laranjas deu-se de fato na África. Mas o Brasil fica logo ali, em algum canto que você quiser encontrar. Sorriso no rosto, a pele morena, branca, parda, o abraço apertado, a amizade distante, força, fé, união. Ela não tem a ginga, não tem samba no pé, não tem o domínio da bola, a firula da moçada. Saiu. Com sua camiseta azul.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

La Trupe

A ração espalhada pelos cantos da casa. A água jogada no chão. Os tufos de pêlos espalhados por todos os cantos. Os gatos tomaram conta do apartamento. A Mulher Maravilha, o Arqueiro Verde, Homem Aranha, Batman, Robin, Coringa, Surfista Prateado, e mais uns tantos que nem sei o nome. Senhor Flores e sua equipe do nariz vermelho, Gordo e Magro, eles também participaram, com toda a certeza. Até o sindico Professor Bartolomeu, se rendeu. Armaram uma festinha. E foi no sábado à noite e não nos convidaram. Funestos. Quase se matam. Quase se jogam pela janela. Correm pela sacada enlouquecidos. Enquanto nós degustávamos uma saborosa feijoada no domingo. Eles, no mínimo amanheciam de ressaca.

Troquei a água, enchi os três potes com ração. Olhei para tudo. Os livros em ordem. “Batmóvel” no lugar, Bartolomeu não respondeu, os felinos sequer ronronaram. O leite estava na geladeira, intacto. Os chocolates no pote pareciam organizados em harmonia, por cores. Na mala trouxemos presentinhos. Três cobertores. Eles ignoraram. Eles não sabem o verdadeiro sentido daquela coisa fofinha. Cada qual no seu cantinho se achegou lentamente. Aproveitando o quentinho que o soft traz. O Martini. Várias doses. As duas garrafas estavam vazias. A cerveja. Os canudinhos sumiram. O suco. As laranjas. NADA. SEM NADA.

Assim se deu o final de semana no apartamento quatrocentos e três. Na segunda, a farra continuou. Três gols e muita pipoca de micro-ondas. Enquanto lá a Holanda prepara-se para enfrentar o Brasil. Por aqui, as coisas também já foram organizadas taticamente. Margareti deve chegar de Santa Catarina ainda na sexta. O síndico liberou o salão central. Enquanto isso, as trocas de elogios continuam, e cá. Será que os felinos sabem que Pelé é melhor que o outro? Será que todos que vivem por aqui concordam? Ah... esse mundo embrulhado. Um café preto. Uma xícara de café preto e bolachas água e sal, é tudo o que restou. Mais um bocado de bolo. Alice quer uma dose de “uisque”. Por favor!



quarta-feira, 23 de junho de 2010

B.ar.(te).


Uma arte intensa. Cheia de cores e texturas. Com uma linguagem que se constrói a cada passo, conversas ou goles de qualquer bebida que ali encontrar. Uma grande obra de arte para a apreciação do seu público, com os mais diversos materiais e possibilidades, mas para ser apreciada durante a noite. Uma casa que se transformou em uma instalação, onde a percepção estética é a chave da comunicação artística.

“Amstad Arte Bar”. Localizado na rua independência em Passo Fundo – RS, não seria um BAR qualquer, não fosse toda a descrição já citada. Mas como um BAR qualquer em uma cidade com tantas opções, ficou meio esquecido. Mas no início não era assim. Lotado. Quase todas as noites. Toda mundo falava do tal bar. Todo mundo comentava da tal decoração. Mas, é um Bar, e por este motivo de uns tempos para cá, não tem a mesma circulação de pessoas, o mesmo ritmo do som, as mesmas cores que me encantaram quando por ali passei pela primeira vez. Talvez a falta de música eletrônica, talvez porque a entrada começou a ser cobrada, talvez porque o lanche da frente é melhor, e o bar do lado de lá é mais badalado. No mês de junho do ano passado, entrevistei o artista plástico que desenvolveu seu trabalho e transformou aquela velha casa em um lugar belíssimo. É isso que vale, enquanto por lá as portas estiverem abertas.

Régis Keller, artista plástico natural de Ijuí – RS, veio a Passo Fundo – RS para estudar desenho em 1993. Há 15 anos a arte tornou-se uma profissão para ele. Participou da instalação da obra “escrita de Deus” de Gustavo Nachle, em 1994. A partir daí vem desenvolvendo o seu trabalho como artista a favor da arte. Uma vida pela arte. Régis é responsável pela obra no “Amstad Arte Bar”.


CD - Quais os materiais que foram utilizados neste trabalho?
Primeiro usamos aquilo que tínhamos aqui dentro. Nós buscamos elementos que também tivessem a ver com aquilo que estávamos trabalhando. Então, usamos as aberturas como um ponto forte, quase que o principal, que era manter as características de casa antiga. Referências, por exemplo, pictóricas de casas desgastadas, de materiais texturados, como a estopa resinada nas luminárias. E consegui alguns elementos com o desenho um pouco mais velho, que seriam as luminárias em madeira com corrente – que estão nas duas peças do centro – dessa textura que está no bar. Procuramos também uma um artista que tivesse alguma referência com essa identidade que nós estávamos criando no bar. Então apostamos que o desenho ele teria um bom relacionamento com a obra do Gustav Klint e nós trabalhamos as impressões (MESAS) de alguns detalhes do desenho do Klint ampliado nas mesas que formam o corredor. Por ser um desenho que tem bastante textura (não é uma pincelada chapada) o trabalho do Klint tem aquilo que nós estávamos buscando, que levamos para as paredes, que é mancha, o desgastado e a cor. Trabalhei também com o grafite alemão, a sterder oito B, tinta acrílica, tinta fosca, uma tinta só com a transparência, vernizes, automotivos, resina, estopa, metal, foram alguns dos materiais que usei durante o desenvolvimento do trabalho.

CD - A linguagem visual foi construída a partir da sua concepção ou em conjunto com os proprietários?
Eles vieram com a vontade. Tinham essa vontade de explorar alguma coisa que fecharia com o desenho do Klint. Então sentamos e avaliamos o desenho do artista, e a partir daí começamos a montar os ambientes.

CD - Você trabalhou a partir de obras de arte. Essa obra fica como uma peça decorativa ou como observação da obra em si?
Estes dois desenhos que fazem parte deste corredor que tem o trabalho do Klint bastante destacado nas mesas acredito que busca essa apreciação. O traço é um traçado múltiplo, tenho várias linhas de grafite que formam a linha principal, como se fosse uma rasura de lápis para poder construir o traço. Essa rasura ela lembra muito a textura que usei manchas das outras salas. Formam uma unidade. E o Van Gogh ele tem aquela pincelada texturada. Eu representei da melhor forma, porque eu não represento o desenho inteiro deles, eu represento um pedaço do desenho, aquele que eu acho que se encaixou mais com o espaço. Em primeira mão, esse desenho é para ter um pouquinho mais de profundidade em uma parede, para criar um pouco de perspectiva. Esse desenho do Van Gogh, (CAFÉ), eu tenho ele com um bar, uma rua que constrói uma perspectiva ao fundo. Essa perspectiva seria quase que um trabalho de tromp oil, só que não necessariamente com o realismo que o tromp oil exige, trabalhei isso. Misturei as coisas. O contemporâneo permite essa mistura de elementos. Eu teria uma técnica adequada para resolver esse problema, que é o problema da perspectiva, mas como o trabalho do Van Gogh era aquele colorido que procurávamos com cores vivas e as cores primárias que eu gosto de trabalhar bastante, o (Van Gogh) artista tem a exploração destas cores de uma forma brilhantíssima. Eu me considero uma pessoa feliz e realizada por poder trabalhar em cima. Tomara que ele não reclame do que eu fiz. Eu gosto muito dessa textura dele, essa pincelada nervosa, onde a todo o instante tem uma pincelada. Você não vem com muita calma, você vem com muita rapidez no fazer. Não é uma pincelada meio sinuosa, ela tem uma certa ansiedade. Ela representa essa rapidez com que ele fazia os seus trabalhos.

CD - Essa arte em lugares mais diferenciados possibilitando o acesso das pessoas estabelece uma forma de construção e desenvolvimento da sensibilidade estética. Você acredita que o seu trabalho possibilita isso para o público?
Desenvolver alguma opinião a respeito e poder desenvolver essa percepção estética é o que a gente espera.
CD – Então essa percepção estética tem o mesmo sentido nestes ambientes ocasionais?
Sim, foi o propósito. Porque no primeiro contato com o proprietário ele esclareceu que a finalidade dele, pelo nome “Amstad Arte Bar”, tinha que ter esse relacionamento. Ele queria ter um diálogo diferenciado para o público dele através de manifestações culturais dentro do seu estabelecimento comercial.

CD – As formas artísticas aqui estabelecidas vão além das suas próprias intenções como artista?
A receptividade está sendo muito boa. Eu estou achando que as pessoas também estão tendo essa visão do quanto é importante essa forma de linguagem. Então, se há satisfação diante do resultado final do trabalho, eu percebo isso porque o público comenta, tem uma receptividade.

CD – Qual a sua percepção de belo?
Nem sempre é o que agrada.

CD - O conceito de “obra aberta” cunhado pelo filósofo Umberto Eco se estabelece neste ambiente?
O ciclo não se fecha. Temos uma opinião nova, porque um número ilimitado de pessoas vai passar e vão ter diferentes formas de perceber esse trabalho. Porque a arte completa, essa linguagem completa, ela vem justamente no momento em que você pode entrar aqui e a cada dia perceber um elemento diferente. Essa é forma de pensarmos a obra como completa, ela é inacabada até o meu público conferir essa linguagem que se adapte a ele. Essa é uma grande instalação.

CD – Velázquez dizia que não pintava uma rosa, mas um borrão que se parecia com uma rosa. Como pode ser identificado o artista Régis?
Eu sou artista plástico, a minha capacidade de conseguir um resultado positivo, eu só consigo em ambientes grandes. Então eu não consigo levar isso até um cavalete ou até um quadro, por exemplo. Eu tenho muita dificuldade em só pintar uma tela, sem criar um elemento tridimensional a sua frente, sem trabalhar o elemento tridimensional através de uma textura. Eu não saberia citar uma característica, até porque é difícil se rotular, mas eu estou dentro do contemporâneo que é essa mistura de elementos. Acredito que as minhas texturas são o mais forte do meu trabalho. Vou muito em busca dessas manchas. Como diz o Velázquez, você quer ver a rosa através da minha mancha, do meu borrão, você vê. Eu estou tentando com que as pessoas vejam, de repente, através das minhas texturas alguma coisa. Isso fica mais evidente para aqueles que observam. Estou trabalhando na minha linguagem há seis anos. Eu trabalho muito com o capital que vem de terceiros, então eu tenho que trabalhar com outras ideias e pessoas em conjunto. Eu não consegui tempo suficiente – fora do trabalho que eu tenho para retorno financeiro, porque precisamos desse retorno também para poder se financiar – para trabalhar minha linguagem. Eu participei sempre de exposições coletivas. Tenho mais um bom tempo em cima até chegar a uma linguagem própria.

CD – Qual parte desta grande obra você tem mais apreciação?
Eu gosto de todo o conjunto. Porque essa grande instalação você tem espaços onde pode contemplar o que agrada o visual. Porque a casa tem muitos espaços abertos, muitas lacunas, e é através destes vãos que a gente consegue perceber as outras peças. Então eu tentei – e acho que consegui acertar de maneira satisfatória – esse equilíbrio que eu tenho entre as cores, entre os elementos que foram usados aqui dentro. Você olha através destes vãos e todo o ângulo que você olha vai ter uma harmonia. As cores vão estar harmoniosas, os elementos vão agradar. Então essa foi a principal preocupação que eu tive e acredito que obtive um resultado satisfatório dentro daquilo que esperávamos.



segunda-feira, 21 de junho de 2010

sexta-feira, 18 de junho de 2010

1922

Acordou cedo. Aceitou a chuva. Saiu para a rua. Aqueles malditos pingos na lente dos óculos. A lente suja, a visão encurta. Na televisão, o futebol. A informação não dizia respeito a nenhum pênalti perdido, nenhuma intervenção de jornalista, nem a temperatura. O dedo pulsa, dói. Ele me fez enxergar outro mundo. Rumo. Intenso. Poético. Político. Seus ciclos. Nossos ciclos ao ler seus escritos.

Meu primeiro contato foi distante e ao mesmo tempo com uma onipresença mágica. Naquela madrugada líamos um dos seus livros com o corpo embebedado de escritos, palavras e risos que se soltavam naquele lugar ímpar. Era para surgir aquilo que éramos incapazes de dizer, mas de sentir igualmente, talvez o que ele queria sentir. O ano de 1922 está estampado naquela camiseta com flores e poesias. Absurdos. Irônicos. Coisas. Vida.

Encontrei-me com ele, pela primeira vez, nem lembro o ano, mas lembro-me das revoluções que se fizeram. Ao sorrir, ao calar, ao viver. Ao me imaginar quase sem fôlego lendo em voz alta, rodopiando pelo quarto, outra vez aqueles escritos. Era a inspiração. Ele misturava meus pensamentos com os de outros tantos escritores. José Saramago. Mil novecentos e vinte e dois. Foi-se tirar o fôlego de anjos e fazer enxergar mesmo quando tudo parece fosco, sem cor, sem brilho, ponto final.

“Acordou com a sensação aguda de um sonho degolado e viu diante de si a chapa cinzenta e gelada da vidraça, o olho esquadrado da madrugada que entrava, lívido, cortado em cruz e escorrente de transpiração condensada”.

“O ditador caiu duma cadeira, os árabes deixaram de vender petróleo, o morto é o melhor amigo do vivo, as coisas nunca são o que parecem, quando vires um centauro acredita nos teus olhos, se uma rã escarnecer de ti atravessa o rio. Tudo são objectos. Quase”.

José Saramago in Objecto Quase.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Pão e o meu circo

Começou. Para muitos começou apenas hoje a Copa do Mundo da FIFA. Futebol não é a sua especialidade. Aprendeu há pouco tempo o realmente sentido da “linha burra”, o impedimento que desabafa e pára a jogada; das variações táticas, de parar para ouvir os comentários em várias emissoras; aprendeu a avaliar; a ter aversão aquele Neto do sotaque carregado. Ah, mas não colabora com as discussões masculinas sobre o novo técnico que acaba de chegar no seu time. Futebol tem outro sentido. Um sentido mais sensível deste circo todo. Essa beleza que aglomera pessoas e esvazia as ruas no dia de semana, emociona, desabafa em forma de grito, som de “vuvuzelas” em salões de beleza e aperta seu coração de tanta ansiedade a cada bola na trave.

O bom de toda essa aflição é que ela só acontece a cada quatro anos. Desta forma, sua mente é recheada de lembranças, momentos, derrotas e aprendizados. Em 1994 era possível sonhar, ter ídolos, gritar, rodopiar pela sala, pintar o rosto e sentir alegria pela vitória daquele time do Bebeto, Leonardo, Branco, Tafarel (o mundo parecia tão bom, tão colorido e um pouco mais justo). Certa decepção e tristeza tomaram conta quando Leonardo num movimento brusco acertou uma cotovelada noutro jogador. Foi embora cedo demais. Pretinho, meu irmão, com quatro anos, tropeçou, caiu e machucou sua boca. E nós, fomos embora cedo demais. O Brasil conquistava seu quarto campeonato.

Em 2006 seus quatro amigos lhe fizeram companhia até os últimos segundos. Pacientemente tentavam desvendar suas dúvidas. Abraçados, seguiam confiantes naquele ônibus rumo à faculdade, levando na mochila um mundo de possibilidades. Deitados naquele gramado, num final de tarde gélido, compartilhavam daquele momento melancólico. A derrota para a França foi premeditada pelo amigo que foi embora. Aqueles meninos estavam tristes, seus rostos demonstravam isso, olhavam para o céu com olhares perdidos, o silêncio tomou conta. A festa, a outra festa, estava quase pronta. Era só aguardar. Era só a banda passar o som, a entrada para o nosso circo era logo ali. “É amigo... É Copa do Mundo!”

15 de junho de 2010. Começou a Copa do Mundo para nós brasileiros. A seleção do Brasil com um grupo fechado tão questionado por muitos, venceu a Coréia do Norte. Dois gols. Muitos chutes a gol. Impedimento, falta, cartão, emoção e o nervosismo de estréia. Os vizinhos enlouquecidos, a rua tranquila, a mulherada gritando a cada lance de ataque, e nós ali, bebendo guaraná, comendo pipoca, concentrados. Quando esperava mais um gol, foram os outros que fizeram. Um grito. Algum Coreano perdido na cidade, ou aquele vizinho que ostenta a bandeira do time adversário na sua sacada. Domingo tem mais, Costa do Marfim. Futebol. Teoria. Prática. Emoção. Paixão. Surpresa. Vitórias.
Ganhei amigos. Fortalecemos a nossa amizade mesmo a distância, eles estão bem pertinho. Ganhei bichos ronronantes, um amigo-amante que me ensina a cada dia mais sobre esse mundo futebolístico; conquistei tantas outras coisas, mas aqueles momentos não se apagam da minha memória. O bom desse mundo futebolístico também é reviver e ter boas estórias e histórias para contar nos próximos quatro anos, ter paixões para alimentar, alegria para gritar, vibrar, opinar na escalação, ter alguém por perto para abraçar. Queremos mais pão e circo, aqueles amigos reunidos, você meu amigo, meu amor, Pretinho, aqueles felinos, aqueles sons irritantes e as emoções de sempre. Enquanto isso, a cá, um time recebe um treinador. É amigo, isso é o Futebol!

sábado, 12 de junho de 2010

Dois

O meu e o seu
São diferentes?
Amor
Igual
Seres diferentes
Moralmente exatos
Válidos
Vinculados
Ah, esse mundinho.

Olhares, só
Trocas, unidos
Olhos fixos
Pensamentos vagos
Palavras que soltam
Riso
O sorriso
Juntos
Enamorados amantes

Amo.
Troco.
Convívio.
Não troco.
Mudo.
Vivo.
Um mundo.

Amamos um ser só
Igualmente diferentes
Cheios de defeitos
Cheias de manias
Completam-se em qualidades
Humores
Incrivelmente uma harmonia

Desarmonia.
Paixão.
Amor.
Troca.
Beijos.

Duas em uma
Contra todos
Amores se constroem
Vivem juntas
Elas,
Flores à distância
Pertencimento que une
Maldita coletividade!
Parte à capital.
Sociedade errante.

Velho e nova
Somos o que se renova
Este amor novo
O amor se alastra
Exala seu perfume de baunilha
Seu perfume sem marca
A sua marca
Corpos em rima
Beleza eterna
Esquece a rima.

E se ela voltar diferente
Ajeita um espaço na cama
Puxa a coberta,
Descobre o coberto
A janela está aberta
Fecha o mundo
Olhares profundos
Amantes emaranhados.

E se ele voltar diferente,
Refaz o esquema
Quente
Troca os afazeres
O amanhecer desperta um fato
Pacientemente
Sirva o amor novamente
Ah, a paixão!

Ah, o amor!
Os amantes
Nós
A sós
Nós os amantes
E os gatos
Ronronantes.
*

*
Muito amor, sempre.
Muita harmonia todo dia.
Muita paz no lar.
Muita conversa todo dia.
Ame sempre toda e qualquer gente.

*


Beijos!

terça-feira, 8 de junho de 2010

A imensidão que ela se propôs

Partiu? Não. Alice ainda está aqui no frio de outro país, noutra elevação. Saudade mutua. Abraço apertado, olhos emaranhados, brilhando. E começou a falar calando tudo ao seu redor. Esquentando a noite. Esfriando os dias. Acalmando os corações. Lendo brasileiros, escrevendo em outra língua, pensando em sinais abstratos. Sentimentos revelados.

Respirando profundamente. Caminhou pelos ares. Andares solitários, comunhão de bens, sentimentos e raciocínios. Ela está ali, parada observando o luar, o vento que corta o seu rosto de bailarina. Como quem precisa de uma música para dançar, cantou. Dançou, recitou e saiu. Os passos lentos e leves. Disse: “Até mais!” Ela vai voltar. Com uma bolota vermelha no nariz, fazendo sorrir os que ainda têm narizes de batatinha, os que já cresceram e os que vivem há muito mais tempo que todos nós. Fantasiando a vida, renovando ela, redecorando os poetas, seus escritos; subindo no palco e nas calçadas mais uma vez.

Imersa em outro mundo para buscar o seu, ou numa tentativa de resgatar o seu próprio mundo? Alice em constante combustão, em inconstâncias revoluções com o seu mundo. “Curta é a vida, longa é a paixão”, releu Luís Fernando Verissimo. Saiu para suas intervenções diárias. Atriz, poeta e sensível como a vida propôs outras circunstâncias para os dias gelados. Abraço apertado e demorado, beijos apaixonados e a saudade se esvaem em segundos; e volta a bater daqueles outros que ficaram naquela cidade sinuosa.

As canções propõem uma imensidão de ideias, e para ela outras tantas formas de fazer sorrir o mundo deles. Alice curte mesmo as crianças, seu narizes, em alguns em forma de bolotas vermelhas, em outros narizes de batatinhas. São eles que transformam um dia gelado numa imensidão de alegria em outro lugar do mundo. Outro mundo, bem mais fascinante, e ela sorriu; e bem mais fantasioso, e o olho dela falou; bem mais sensível.

domingo, 6 de junho de 2010

Primeiro a larva

...
Surpreendentemente se encontra ali
Diferente
Coisas que só você pode fazer
E fez
Recostou-se no sofá
Sentou-se no chão
Onde o sol estava.

Os dias em que éramos pequenos
Borboletas
Somos
Paixões
Amores
A velha bicicleta verde
O empurrão que fez mudar
O mesmo lugar
Vamos andar?

Saiu.
Partiu.
Sumiu.
Desapareceu.

Não viu
Não sentiu
Escondeu-se no escuro
Sorriu.
Falou.
Dançou.
Gritou.

Surpreendentemente o tempo voltou
Reuniu outra vez
Aquele velho papo bom
Mano
Valeu “Pretinho”
Aceito um café
Um bom dia para o café da manhã.

Um labirinto para chegar
Afeição
Dias estranhos voltaram
Força
Aquelas mesmas pessoas estranhas
Verossimilhança
Viva
A vida
“Tem que ser sangue bom”, Pretinho!

quinta-feira, 3 de junho de 2010

O fulgor das estrelas

Eu me apaixonei pelo luar. Pelas noites frias, pelas noites quentes e escuras. Me apaixonei pelo horizonte e pelas luzes das casas que de lá surgiam. Queria saber “quenhé que morava lá”. E que lugar é aquele? Na verdade queria saber mais, mas só a minha imaginação poderia me proporcionar estas respostas. Eram momentos ouvindo, sonhando, alimentando paixões, construindo objetivos e desconstruindo histórias infantis. Ninguém vira uma estrela no céu. Tinha receio de desvendar essa façanha – tão anunciada pelos adultos – sozinha. Mas foi o que aconteceu. Não lembro quando, nem onde, mas descobri que meu avô continuava a me contar as histórias dos ranchos longínquos, das constelações, da sua balsa no rio, mesmo tão distante de mim. Foi assim que me envolvi nos sonhos e cativei alguns objetivos. Assim, e com tantas outras coisas, que até o final da sua vida o Senhor Arthur ajudou a construir a minha essência.

Sentir a ausência. Perceber a onipresença sem poder sentir a sua pele em ondas, aquele sorriso que me abraçava, o olhar sincero, as mímicas, as mãos que brincavam com os meus olhos e que escondiam os doces. Era uma recepção programada. O som daquele chinelinho arrastando no piso de madeira soa na minha memória. Ela está aqui. Como se ouvisse perfeitamente bem. Como quem sente a aflição alheia. Como quando entrava no seu quarto, ajudava na escolha do vestido, dos brincos, do colar. Ela sentava na sua cadeira frente ao espelho, passava pó naquele rosto sorridente com uma delicadeza e uma destreza impar. Olhava-me por cima, com um sorriso ladino, depois me entregava as “ramonas” para que eu fizesse o melhor penteando, naqueles poucos fios de cabelos compridos. As unhas sempre pintadas, os vestidos bordados e o cheiro da sua pele não me deixam esquecer os bons momentos que passei ao lado da Senhora Paulina, uma professora, uma mãe, uma avó e uma amiga.

Foi num verão, nas férias da escola que mais senti a falta do meu pai, porque sentia o amor que ela tinha por ele. Ao lado dela assistia o jornal na televisão, aprendia a fazer o melhor arroz que já comi, a dar e receber carinho. Ao lado dela e com ela, aprendi a ser forte. Foi ela quem me ensinou a ajudar sem medir esforços, sem receber recompensas. Herdei vestidos, uma mala, um anel e infinitas recordações. Guardo na minha caixinha a nossa sintonia, os nossos olhares e todo o nosso amor. Resgato de lá, quando preciso respirar fundo. Apenas as boas lembranças. Apenas a verdade que me envolve com eles. O pai da minha mãe e a mãe do meu pai. A minha avó, minha luz de todo o dia.

Desde o último inverno oito pessoas fazem esse entrelaço com meus avós. Trocamos conhecimentos, vivenciamos experiências, sensações, convivemos com a arte. Eles completam o que se foi: o abraço, o cheiro, o carinho, os conselhos sábios, as histórias que me encantam. Nada melhor do que ter sempre por perto alguém com mais de 60 anos, sorriso no rosto, disposição, vontade de viver e recomeçar sempre. Leveza e intensidade. Sem olhar para o céu, sem pensar nas estrelas que não foram.

terça-feira, 1 de junho de 2010

(Re) Construindo

Abandonei esse espaço. Mas por alguns bons motivos. Passei dias e meses me dedicando ao Trabalho de Conclusão do Curso, no qual rendeu a nota máxima. Depois, foram dias, organizando a festa e o discurso da formatura. Com o verdadeiro valor da virtude da paciência. Dedicação e amor a um objetivo nos beneficiam com momentos belos, únicos, divertidos e de muita felicidade, com a certeza de mais uma etapa concluída. Guardo na minha caixa aqueles momentos.

Depois da monografia existe vida, e latente, intensa, pedinte de movimento, ao menos pra mim. Busquei livros, cursos, provas. E fui atrás. Numa destas leituras desse mundo, encontrei ótimos autores, que servirão para discussões futuras neste espaço (sim, mais do que nunca voltei), agora cursando especialização na área, necessito deste exercício. Mendoza, em La islã inaudita, discorre na introdução do livro A construção da notícia de Miquel Rodrigo Alsina sobre a verdade e o valor que nela consiste. O meu horizonte cognitivo está entre estes meios e processos. E este mundo onde estou submersa está consistentemente imerso nas notícias, informações e na construção destas com a realidade. Já que “o jornalista é um produtor da realidade social” segundo Alsina, todas estas vertentes cá estarão. Todas as que estão submersa: a arte, os absurdos da vida, o jornalismo e a cidadania.

“Você sabia que algumas destas estrelas que agora você vê aí, na verdade, já se apagaram há milhares de anos, mas que, por causa da sua distância, continuamos percebendo sua luz e admirando o que já não existe mais? Isso demonstra até que ponto nos é fácil enganar e sermos enganados. No entanto, quanta importância damos à verdade! O senhor não acha?” (MENDOZA, E. La islã inaudita. Barcelona: Seix Barral, 1989, p. 125-126).


Muita paz!